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                       O hiv não tem  preconceito!

Hoje, estou firme e forte, sentindo-me muito melhor e tentando resgatar a minha auto-estima. Aprendi que os possíveis efeitos colaterais dos remédios podem ser amenizados com exercícios físicos. Entrei num curso de dança de salão e faço caminhada na praia, todas as tardes.A decisão de parar refletiu na minha saúde, mas valeu como experiência e amadurecimento.
Na equipe de DST/Aids, trabalhei por quase oito anos e, todos os dias, ouvia  histórias de pessoas que sofriam muito, mesmo sem sentirem dores físicas. Elas costumam chegar com a cabeça baixa, cheias de vergonha. Na verdade, é uma tonelada de pavor que está nas costas delas: pavor da doença, da família, do remédio, do futuro, do tratamento, do marido, do mundo e da morte. E, como se sentem impotentes diante da situação, resolvem morrer. Trata-se de uma morte lenta, dolorosa e cruel, na qual se culpam e se torturam a cada minuto:
“Eu mereço isso, porque não usei camisinha, acreditei na pessoa errada, me droguei, me piquei e me devorei viva!” Por mais que você tente dizer o contrário, elas não o ouvem, porque a sociedade produz um eco, reforçando aquela autodestruição. A sociedade não percebe que, nas grandes epidemias, devemos ficar do lado do paciente, e não da doença. O alvo deve ser o vírus, e não o portador dele.
O HIV é traiçoeiro, “malaco”, sem escrúpulos... Mas quem o hospeda é gente de verdade, com cara, corpo e alma. Esse alguém tem nome, sobrenome, família, sonhos, destino... Muitas vezes, já perdeu até a esperança, mas não se deve permitir que ele também perca a dignidade!
Então, por acreditar na solidariedade que ainda existe dentro de nós, resolvi escrever o livro Flash e foi um sucesso na primeira edição.Então  o Intimus Flash  veio pra complementar a minha história com novos detalhes, fatos e fotos.
Não pensem que foi fácil remoer os meus próprios preconceitos e tabus; mas é preciso erguer a cabeça também, criar coragem e estender as mãos,dizendo ao outro: “Você não está só. Eu estou contigo!”
Vivemos numa época moderna, com um grande avanço científico e tecnológico. Não podemos nos comportar como homens da Pré-História, recuados dentro de cavernas escuras. Precisamos expulsar nossos medos, com a luz do esclarecimento e da razão.Somos seres vivos. Então, que sejamos humanos, acima de tudo!

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Eu amo os meus filhos! São três homens de personalidade forte e determinada, mas sensíveis e amorosos. Encaram a vida de frente, com muito bom humor. É lógico que, muitas vezes, tudo isso vira “balela”, e tenho um chilique daqueles, colocando a mão no peito:
— Santa Quirupita, eu acho que chegou minha hora! Vocês me matam de raiva! – e reviro os olhinhos. Nisso, eles partem para cima de mim, às gargalhadas:
— Essa não “cola” mais!
Já aconteceu de ficarmos dias de “trombeta”. Outro dia, André estava rolando com o cachorro no chão da sala e se virou para mim, dizendo: “Estamos discutindo a relação!”. Em casa, discutimos muito a nossa relação. Não existe um assunto proibido. Falamos de tudo um pouco e sexo, drogas e bons costumes são os nossos preferidos. Meus filhos não são meus; são do mundo! Nunca bati em nenhum deles, e tudo é resolvido com muita conversa. Cada um tem seu próprio estilo, e isso é respeitado. As palavras mágicas “por favor”, “não entendi”, “não concordo”, “desculpa” e “obrigado” são usadas por todos e com todos.
Ninguém impõe nada. Não existem ordens sem explicações, nem castigos absurdos. Tratamos os meninos como um todo, ouvindo suas queixas e dando importância a elas. Se eles vão mal na escola, procuramos reforçar a auto-estima, com incentivo e motivação. Permitimos que tomem atitudes e sejam responsáveis por elas.Todos praticam esporte e estão em contato  direto com a natureza.Surfam debaixo do sol e da chuva.Dificilmente ficam doentes.Na verdade, eles não têm frescura.Possuem muitos amigos, e nossa casa é a mais alegre da rua, com a molecada brincando e falando ao mesmo tempo. Serginho curte a criançada e acredita que eles só trazem energia boa.E isso é muito bom! No início deste ano sofremos quatro enchentes e perdemos  quase tudo.Passamos a dormir em colchões  jogados no chão da casa e eu  abri conta  na  Lan House do Cleber e do Joca porque  meu computador inundou d’água e peixe podre.Precisamos sair da casa na calada da noite e Raphael salvou  dois dos nossos cachorrinhos e  o mais velho morreu afogado.Ele até tentou ressuscitá-lo com massagens no  peito e  respiração “boca a boca” com uma garrafa pet, enquanto chorávamos e ríamos ao mesmo tempo porque a situação era ridícula.
Então fomos morar com a minha mãe , perto da praia, até conseguirmos nos reestruturar novamente.Na véspera do carnaval acordei com um barulho estranho no quarto  e Serginho estava tendo uma convulsão ao meu lado.Quase enfartei! Ele parecia possuído; olho estralado, boca com espuma, corpo tremendo e duro feito um pau de sebo. Corri até a sala onde o Raphael se preparava para mais um dia de trabalho como salva vidas e só consegui dizer baixinho, chorando  : - Ele está morrendo, corre!
Raphael pulou sofá, travesseiro, mesa, cadeira, calado.Avançou pelo corredor como uma flecha e vendo o meu desespero, trancou a porta do quarto, dizendo que tudo ficaria bem.Lá dentro ele realizou vários procedimentos que na verdade nunca soube ao certo; virou Serginho de lado, fez ele vomitar, lhe embrulhou num lençol e chamou o resgate.Parecia um doutorzinho de cueca.Depois foi para o serviço. Só sei que eu não conseguia me mexer e apenas rezava.Logo chegou a ambulância e ele foi internado na Santa Casa em estado grave.Fomos muito bem acolhidos por todos e a família Rossi, mais unida do que nunca,  nos amparou  com carinho e proteção.André permaneceu ao nosso lado o tempo todo enquanto João chorava no pé da cama.Graças a Deus ele teve alta após três dias, como se nada tivesse acontecido.Foi só um susto! Talvez vítima de estresse dos últimos acontecimentos.O médico disse que foi seqüela da toxoplasmose.Vai saber!
Hoje os meninos brincam, dizendo que Serginho foi molestado  sexualmente  por Raphael,  depois ressuscitou e gamou!


 

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