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                                  Lua de Mel de Donzela

Eu não sabia de tínhamos transado e estava muito confusa.E se estivesse grávida? Sentia  fome demais! Uma barriguinha saliente apontava para a lua. Resolvi  procurar um médico para fazer o teste de gravidez.Expliquei a ele que tinha tido relações sexuais sem camisinha.Será que aquilo havia sido uma relação? Ainda sexual? Quem poderia me ajudar?Ele tocou em mim e de certo estaria prenha, sem ao menos ter chegado ao finalmente

-Vou te pedir alguns exames, tá?

Se estivesse grávida, tudo bem.Assumiria sozinha, de boa.Enquanto o ônibus balançava de um lado ao outro, tentava escolher o nome do bebê.É lógico que seria Raphael.Sem medo de ser feliz.Só que eu nunca fiz aquele teste porque tive medo do resultado.
Estava dando um brilho no carro quando apareci do nada, lhe chamando para o canto:
- Fábio, preciso lhe contar uma coisa...Acho que estou grávida.
- Como?! Você não era virgem?
- Até aquele dia lá, era.Aliás, naquela madrugada no seu quarto.Agora não sei mais nada.
- Silmara, não aconteceu o que você ta pensando.Foi por isso que sumiu de mim? Bobagem, você continua do mesmo jeito que nasceu.Pergunta pra sua mãe como se faz filho.Com certeza não é daquele jeito.Coitado de mim.Fico aqui na secura por você e ainda acha que ta grávida? É demais para o meu coração.Só se for filho do vento! Kkkk
- Sério??! – pulei no seu cangote.- Obrigada meu amor! Obrigada, você é demais! - lhe ei um beijo estralado.
A noite meus pais vieram com a triste notícia  que viajariam para o interior  no meio do ano e levei um choque.
- O quê?! Por quanto tempo? - Meu Deus, eu não merecia tamanha felicidade.
- Silmara, a gente precisa desse passeio.Faz tempo que não vejo ninguém da minha fam´lia- explicou mamãe.
Quase desmaiei de alegria e por um triz que não morri antes da hora.
- Caramba, sacanagem! – virava os olhinhos- Não sei viver sem vocês! - fingia.
Contava os dias com um círculo vermelho  no calendário.Nem dormia mais a noite.Pedi até para tocar as passagens com medo que fosse tudo balela.Parecia um sonho!Finalmente iríamos ficar a sós em lua de mel. Era um bom motivo para lhe procurar.Ficamos rodopiando com o carro e paramos  em frente ao cemitério Quarta Parada.O mesmo cemitério que seria enterrado anos depois.Deitou o banco e sorrimos:
- Casa comigo...- pedi segurando sua mão.
- Eu não posso.Estou ficando cada vez pior.Os pêlos do meu corpo estão caindo.
- Que desculpa esfarrapada é essa?
- Eu não queria te magoar, mas é a mais pura realidade.Tenho anemia.É sério.
Que cara louco! Não sei como consegui ficar tanto tempo numa paranóia daquela.
- Você precisa se decidir, Fábio.
- Sobre o quê? Fala logo.Não to te entendendo.Explica melhor.
- Idiota.Se você quer suco de cebola ou de quiabo...- brinquei.
- Com gelo? – sorriu.- Pode ser qualquer um?.Nossa, você é pirada, né?
Que raiva.Bati a porta do carro e sai fora querendo gente normal.Boas idéias.Um bom papo.

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Com 18 anos, iniciei o curso de Letras, na Faculdade Capital, mas no segundo ano precisei abandonar os estudos porque ele ia me procurar na sala de aula todas as noites, impregnado de tanto remédio. Para mim era uma tortura,  porque se demorasse para ir embora com ele, se derretia na grama do jardim, descansando. As pessoas achavam que era um mendigo
e zoavam com ele, jogando água na sua cabeça. Pobre menino rico! Na gaveta do seu guarda-roupas tinha tantas correntes de ouro italiano que dava para se vestir com elas, mas ele preferia usar um agasalho velho e um chinelo de dedos.
Quando minhas amigas Vera e Valéria Salton comentaram sobre um concurso público para ingressar na Secretaria de Saúde, treinei datilografia até criar calos nos dedos. Dito e feito. Após alguns meses, já estava pegando o “busão” para o Centro de Saúde da Vila Maria. Dentro da minha mochila tinha de tudo um pouco: laranja descascada, suco de groselha, bolo
de cenoura; minissaia, se fizesse sol; jaqueta de brim, se esfriasse; e toca de lã, se nevasse. Com o meu próprio dinheiro, passei a me arrumar melhor.
Comprava minhas roupas no Brás e sempre estava uma boneca. Para ele,
levava também camisetas e bermudas da moda. Era uma moça bonita e inteligente; ninguém acreditava que pudesse ter um namorado tão estranho assim. Muitos carinhas tentavam se aproximar, mas eu era completamente apaixonada por ele. Aprendi a não gostar de
homens aparentemente “normais”, pois eram chatos e suas conversas intelectuais
cansavam a beleza. Ficava apenas observando o jeito de cada um
e me irritava com eles, porque falavam muito. Era só gogó! Muito “blábláblá”
e pouca atitude. Fábio não conversava; apenas sorria quando estava feliz ou chorava, se
estivesse triste. Era autêntico. Para nós, as palavras não tinham muito valor, porque ele não conseguia raciocinar direito. Então ficava mudo.

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Finalmente havia chegado o dia da grande viagem dos meus pais.Eu cantarolava alto e não cabia em mim de tanta felicidade.
- Coitada da Silmara.Tá rindo pra não chorar.É o desespero.Fica bem, filha.
E viraram a esquina me enchendo de recomendações.
- Claro, claro!
- Nada de Fábio aqui em casa, hein?
- Quem é Fábio? Ah, o filho do Preguinho??! Tô fora! Passado.Aquele horroroso tá por fora!
Quando tive a plena certeza que estava tudo bem  fui lhe procurar na fábrica dando o seguinte recado: lua de mel, bebê!  Havia saído cedo para fazer uma entrega e ás sete horas da noite apareceu em casa todo cheirosão. Eu estava agitada e não conseguia acreditar que tínhamos todo o tempo do mundo para nós dois e mais ninguém.Caímos  no tapete e rolamos de lá pra cá.Que faculdade o quê!
- Eu te adoro, querida.E agora é a nossa vez.
Começamos a pular de mãos dadas em cima do sofá.Estouramos   pipoca e ele pediu para tomar um banho, colocando o pijama do meu pai.
- Agora me chamo Oscar.Maria, se eu pegar aquele paspalho do Fábio por aqui, capo ele!
Ríamos de pura emoção e adrenalina. Quase meia noite. Me pegou no colo e  quase nos transformamos em um.
- Fábio, ainda é cedo.Espera mais um pouco.A gente tem um mês de lua de mel.Preciso me preparar melhor, tudo bem?
Duas horas da manhã.Lutando contra o sono...Quatro horas.
- Dorme linda.Eu fico te olhando.
Estávamos na cama dos meus pais.Raiva.Droga.Precisava dormir. Começou a cantar uma música de ninar.
- Dorme meu nenezinho do meu coração...
Quando acordei já havia ido embora e deixou uma pilha de louça suja esparramada pela casa.
Estava super atrasada para o serviço.Olhei no relógio: sete e meia da manhã.Entrava ás oito. Disseste bem: entrava .Virei do lado e capotei.Na hora do almoço apareceu pulando o muro e me acordou com uma música  desafinada tocada numa flauta.
Delirava de tanto tocar.Fui me envolvendo com o ritmo alucinado e sacudíamos o corpinho cheio de hormônios e “demônios”. Tomamos chá e comemos bolacha.Chá??! Pra quê.Vamos fazer um almoço caprichado.Eu não sabia fritar um  ovo e estava morta de fome.Torrei tudo na frigideira e pra não minguar de fome estourei  mais pipoca.Eu parecia a rainha do lar e seu amante Ricardão.Ou melhor, Fabião, o consolo das donzelas encalhadas.

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Eu estava perdida naquela casa com um monte de sujeira por todo o lado.Não tinha noção de hora e de espaço.Lembrei que tinha aula na faculdade e comecei a me arrumar rapidamente, pois ia a pé.Soltei os cabelos e estava só de calcinha e sholtien quando apareceu na janela.
- Aonde você vai, madame?
Me comia com os olhos e eu lhe espiava por rabo de olho.
- Não quer ficar comigo? Faculdade é coisa de gente brega.Um monte de babaca obcecado.Fica em casa...na nossa casa.Olha, eu faço o almoço.
- É quase noite.
- Já?!! Que fora! A gente quer agradar tanto e no fim só fala abobrinha.
Abri o guarda roupa e coloquei um casaco.Era uma moça bonita e tinha o meu próprio estilo.
- Vou te pedir pela última vez...
- Segura sua franga, bebê.Já to estourando em faltas.
- Estou no lugar do seu pai e você não pode chegar tarde em casa.-Tragou de novo, irritado.- Então deixa eu ir com você...
- Você só faz bagunça na porta da faculdade e depois o pessoal fica te zoando.
- Eu não me importo.Tá tudo bem.É brincadeira da turma.Deixa vai.Olha, eu não tenho nada pra fazer agora.A gente vai de carro.Se quiser, de caminhão.Ou de moto? É uma Sete Gala! Tem o jipe ...E o Monza preto.Quer ir  andando, tudo bem.A gente vai batendo papo.
- Nada feito.Thau! Deixa a chave embaixo do vasinho e se puder da um trato na casa.
- Por favor...
- Fábio, aonde eu vou você não pode entrar.- abaixei os olhos- O mundo é cruel e eles zoam com você.Fica aqui, me espera em casa.Assiste a novela, sei lá.
A verdade doía , mas ás vezes sentia vergonha dele.

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Em plena madrugada deu dois toquinhos na porta da sala.Fiquei com medo.Três e meia da manhã. Abri devagarzinho  a veneziana e dei de cara com sua cara amassada:
- Sou eu, meu bem.Tenho insônia.
- Meu filho, eu trabalho amanhã.Aliás, daqui a pouco.Vai dormir.
Caiu pra dentro puxando minhas cobertas.Ligou a TV e fez sinal de silêncio.
- Fica quietinha.Psiu!
Quando estava conseguindo fechar o olho, me sacudiu:
- Me faz um lanche?
- O quê ?! Na sua casa você tem duas empregadas...aqui a única empregada sou eu.
Nossos olhos foram cerrando aos poucos.De repente acordei assustada:
- Eu não posso mais faltar no serviço.Você precisa me deixar dormir só um pouquinho mais.
Nos abraçamos sentados e fomos escorregando até o chão.Quatro e quarenta.O assobio do guarda noturno.Estávamos um grudado na camiseta do outro.
Quando abri os olhos era uma hora da tarde e mais uma vez havia perdido a hora.Chamei por ele e não estava mais ao meu lado.De repente apareceu com a toalha enrolada na cabeça:
- Não tem shampoo nesta casa?
Nossa, se meu pai soubesse desses detalhes, enfartava de pura raiva.
Eu não saia mais de casa e ele ficava ali comigo.Fazíamos de tudo um pouco e só não transávamos.A comida estava acabando e o dinheiro também.Mas pra quê comer, beber...se eu tinha o seu corpo para me deleitar?

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